Geral 17/08/2023

Incorporadoras de médio e alto padrão querem lançar projetos econômicos

*Publicado por Ana Luiza Tieghi | Valor Econômico 


As novas condições do programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV), anunciadas em junho, atraíram incorporadoras de médio e alto padrão para o segmento econômico.


O movimento é sentido principalmente em São Paulo, onde o valor máximo para venda no MCMV passou de R$ 264 mil para R$ 350 mil. A revisão do Plano Diretor da cidade é outra ajuda.


Como explica Guilherme Bueno Netto, da gestora RBR Asset, aumentaram os incentivos para se construir habitação de interesse social (HIS), para famílias com até seis salários mínimos de renda, e habitação de mercado popular (HMP), para até dez salários. O MCMV abrange famílias que recebem até R$ 8 mil mensais.


A You, Inc é uma das incorporadoras que anunciaram a entrada no econômico. O fundador e CEO da companhia, Abrão Muszkat, conta que a empresa deve ter entre 30% e 35% do seu valor geral de venda (VGV) na faixa 3 do programa. Hoje, as unidades que custam até R$ 350 mil são 20% dos lançamentos da empresa, especializada em compactos e médio padrão.


Agora será possível vender essas unidades para um público que não era atingido pela incorporadora. “No momento em que o governo dá essa oportunidade, não dá para ficarde fora”, diz Muszkat.


A expectativa da You, Inc é lançar o primeiro prédio do MCMV em meados de 2024. Para isso, será criada uma nova holding, separada da sua operação tradicional.


A Lavvi vai operar no MCMV com a marca Novvo. A empresa, que constrói na alta renda, comprou no ano passado seu primeiro terreno para o MCMV, na Barra Funda. O projeto deve ter a primeira fase lançada ainda neste ano, segundo disse o CEO, Ralph Horn, na teleconferência de resultados.


A empresa contratou um time de engenharia com experiência na área econômica e tem terrenos avaliados em R$ 1,6 bilhão de VGV que podem ser do programa.


Na preparação da Novvo, Horn afirma que a empresa tem visitado e analisado projetos da Cury e da Plano&Plano, incorporadoras econômicas que, como a Lavvi, têm investimento da Cyrela. A operação da Novvo também é comparada com a própria Cyrela, que opera no MCMV com a marca Vivaz.


Para ele, deve haver aumento de competição no setor, mas quem tiver os melhores produtos, com a melhor localização, vai vencer. “Vamos para a briga com o melhor possível, bem focados.”


A Mitre, que tem sua linha Origens na “fronteira” do teto do programa, avalia se vale apena reduzir o tamanho das unidades para enquadrá-las no MCMV, segundo Fabrício Mitre, presidente da empresa. A possível entrada no segmento econômico também ocorreria com uma outra marca, que seria minoria no portfólio.


A Trisul, de média renda, anunciou que, do seu banco de terrenos de R$ 4,2 bilhões, R$1 bilhão podem ser enquadrados no MCMV. A Tecnisa planeja entrar no programa com cuidado e com parceiro da área. “Não tem como não participar desse mercado”, diz o presidente Fernando Tadeu Perez.


A cautela tem motivos: a Tecnisa tentou atuar no programa no passado, com a Tecnisa Flex. “Foram fazer baixa renda com DNA de médio e alto padrão e não deu certo”, afirma o presidente.


Bueno Netto analisa que um dos motivos para as incorporadoras estarem animadas como MCMV é conseguir aproveitar o funding do FGTS, que abastece o programa.


O financiamento para obras de média e alta renda tradicionalmente usa recurso da poupança. Esse mesmo dinheiro também financia os compradores dos imóveis. Como a poupança está perdendo recursos, os bancos têm preferido direcionar mais desse dinheiro para as pessoas físicas e menos para as jurídicas. Restam para as obras os fundos, como os da RBR, e financiamentos bancários com outros recursos, ambos com taxas mais altas no momento.


Os financiamentos do MCMV, porém, são operados pela Caixa, e aí pode haver uma barreira para a entrada no programa.


“A Caixa está mais restritiva do que foi no passado sobre concessão de crédito para financiar construção, não é qualquer incorporador que consegue”, diz Hugo Grassi, analista do Citi Bank.


“Quem não tem relacionamento com o banco vai levar um ano e meio para acertar isso”, diz Muszkat. A You, Inc já faz obras financiadas pela Caixa.


Companhias que já se dedicam ao econômico se preparam para o aumento de competição e aproveitam o fato de estarem na dianteira. Com os novos parâmetros do MCMV em ação, a MRV viu em julho um aumento na busca por imóveis de 54% no país e de 55% no Estado de São Paulo, ante o mesmo mês de 2022.


A incorporadora Nortis atua desde a sua fundação, em 2018, na baixa renda com a Vibra, que deve lançar perto de R$ 630 milhões neste ano. Para o ano que vem, a expectativa é aumentar para cerca de R$ 800 milhões.


Lucas Tarabori, diretor da Vibra, afirma que o novo MCMV faz com que a empresa consiga atender mais clientes e com entradas menores. Também será possível repassar parte do aumento do custo de construção dos últimos anos.


A EZTec, que constrói no econômico e na média e alta rendas, deve aumentar os lançamentos da sua linha de entrada, a Fit Casa. O plano é ter de 20% a 25% do VGV na marca, segundo o presidente, Silvio Ernesto Zarzur.


Na Cury, a “ordem do dia” é comprar terrenos em São Paulo e no Rio, segundo disse o presidente, Fabio Cury, em teleconferência de resultados. Os terrenos dão o primeiro sinal da alta na competição no segmento.


Grassi analisa que, mesmo assim, a competição no MCMV está mais tranquila do que já foi no passado, porque “players” pequenos perderam capacidade operacional nos últimos anos.

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